terça-feira, 10 de outubro de 2017

JOSÉ FELICIANO DE OLIVEIRA: UM GRANDE JUNDIAIENSE

Os evangelistas Lucas ((4, 24), Mateus (13, 57), Marcos (6, 4) e João (4, 44) relatam como Jesus foi recebido com desdém em Nazaré, cidade onde crescera: seus conterrâneos diziam coisas como "é apenas o filho do carpinteiro"... A resposta de Jesus tornou-se um clássico em latim: "Nemo propheta in patria sua", algo como ninguém é profeta em sua própria terra.

Em nossa terra confirma-se a veracidade dessa expressão: quase ninguém sabe quem foi o Prof. José Feliciano de Oliveira - muitos apenas sabem que ele dá nome a uma escola de Jundiaí. Mas ele talvez tenha sido o maior de nossos intelectuais.

Feliciano e seu observatório
Nascido em nossa cidade em 1868, de família humilde, começou a trabalhar nos Correios aos doze anos, tendo depois se mudado para São Paulo, onde se graduou na Escola Normal em 1887. Havia aprendido as primeiras letras em escola mantida pelo professor João Batista de Farias Paes.

Aos 14 anos, liderou a criação do primeiro Gabinete de Leitura de nossa cidade. Nesse empreendimento, que infelizmente não foi à frente, teve o apoio de cidadãos ilustres de Jundiaí, dentre os quais José Flávio Martins Bonilha, Artur Guimarães, dos futuros desembargadores Miguel Brito Bastos e Inácio Arruda, Carolino Bolívar de Araripe Sucupira (o Major Sucupira, veterano da Guerra do Paraguai) e membros da família Queiroz Telles. 
Em 1893

Extremamente culto, estudou e lecionou Português, Francês, Latim, Física, Matemática e Astronomia. Chegou a construir um observatório em sua casa, que ficava na Rua Da. Antônia de Queiroz, próxima à Rua da Consolação, em S. Paulo – seu objetivo era permitir que seus alunos tivessem aulas práticas. Em 1892 era o diretor da Escola Municipal da Sé, em São Paulo.

Interessou-se também pelos indígenas, tendo estudado os Xerentes, que viviam às margens do Rio Tocantins. Descreveu suas aldeias, vida doméstica, forma de governo, rituais,   lendas, sistema de numeração e conhecimentos astronômicos. Obteve informações principalmente através de Sepé, um cacique dessa etnia que viajou algumas vezes ao Rio de Janeiro. 

Republicano e abolicionista era seguidor e um grande nome do positivismo, corrente filosófica que surgiu na França no começo do século XIX, cujo principal expoente foi Augusto Comte. Em seus escritos sobre os Xerentes, Feliciano deixou claro sua crença no positivismo e atitudes anticlericais no que se refere ao relacionamento das igrejas com os índios. 

Publicou inúmeros artigos em revistas e jornais, além de livros, dentre esses "A propaganda positivista em São Paulo" (1898), "Cometas, bólides e estrelas cadentes" (1901), "O ensino em São Paulo" (1932) e "José Bonifácio e a Independência" (1955).


Benedicto Castilho de Andrade e o Prof. José Feliciano de Oliveira no Restaurante das Carpas nos anos 1950
Em 1911, mudou-se para Paris, onde viveu até 1958, ministrando cursos na Sorbonne e no Instituto de História das Ciências, anexo à Universidade de Paris; na França, foi também conferencista e colaborador de vários jornais. 


Foi professor por setenta anos, deixando a cátedra aos noventa anos de idade. Dizia-se que falava com entusiasmo, com um belo timbre de voz e dicção clara, falando com os olhos fixos no alunado, sem recorrer a anotações. 

A respeito dele, escreve Omair Guilherme Tizzot Filho em tese apresentada à Faculdade de Educação da USP: "Como educador, defendeu a regeneração social através do ensino, com a incorporação do negro, do índio e do proletariado, e a preparação adequada para a vida moral em sociedade, possibilitada pelo ensino integral. O professor deveria ser, para ele, um exemplo de comportamento voltado à pátria, que incentivasse os alunos a se comportarem com urbanidade a fim de que pudesse haver progresso".

Já o Professor Pierre Ducassé, da Sorbonne, dizia: “professor igualmente notável pela pujança pedagógica como pela ciência, José Feliciano quis ser o apóstolo totalmente desinteressado das únicas convicções que lhe pareciam unir ao amor da Humanidade, que lhe iluminava a vida, a certeza da ciência que lhe iluminava o espírito”.

Amante dos livros comunicou ao Gabinete de Leitura Ruy Barbosa, de nossa cidade, que iria doar à instituição metade de sua biblioteca, composta à época por cerca de onze mil livros, conforme noticiou o jornal Folha da Manhã, em sua edição de 6 de setembro de 1946. Em 1977, o remanescente de sua biblioteca, quase oito mil volumes, foi doado ao Instituto de Estudos Brasileiros, da USP.

Faleceu em São Paulo em 1962, tendo sido sepultado em Jundiaí. Dele disse em seu blog o Prof. José Renato Nalini, outro ilustre jundiaiense: "estive em seu enterro. Impressionou-me o homem elegante, de barbas brancas, um monóculo de lentes azuis, como a repousar na urna". 

E conclui o Prof. Nalini: "Será que os alunos egressos da Escola que leva seu nome têm consciência do significado e importância de seu patrono?" 


Apostaríamos que não...





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