domingo, 20 de janeiro de 2019

NOSSA CIDADE EM 1818

Luís D'Alincourt (também grafado "de Alencourt" ) nasceu em Oeiras, Portugal, em 1787 - Oeiras é uma cidade próxima a Lisboa. Em 1799 iniciou carreira militar; em 1809, transferido para o Brasil (a família real aqui chegara no ano anterior), graduou-se pela antiga Academia Militar do Rio de Janeiro.

Membro do Corpo de Engenheiros, viajou muito por nosso país, cumprindo missões de pesquisa que lhe foram atribuídas pelo Exército - permaneceu no Exército Brasileiro após a independência - tendo falecido em 1841 no Espírito Santo, onde, com o posto de major, cumpria mais uma missão. 

Escreveu muito, sendo uma de suas mais importantes obras a "Memória sobre a viagem do porto de Santos à cidade de Cuiabá", relatando viagem que realizou em 1818; a obra foi publicada em 1825 e reeditada várias vezes. No livro, descreve nossa cidade, descrição que é objeto deste post, no qual procuramos manter a grafia original:  



"Jundiahy, pequena Vila na Latitude de 23º 6’40” e longitude de 46º 57’ a Oeste do Meridiano de Greenwich, menos de uma milha distante da margem esquerda do rio Jundiahy-Guacú, que lhe passa ao norte, e vai desaguar no Tietê, quatorze, para quinze léguas distante da direção, em que este rio corre próximo a S. Paulo; está colocada ao longo do cabeço de um monte, dez léguas ao Nor-noroeste desta Cidade: o monte tem suave declive até ao vale, que lhe fica ao Sudoeste; para o lado oposto a inclinação é mais áspera; as ruas são alinhadas, e largas, dispostas paralelamente umas às outras; todas as casas construídas de taipa e terras, à exceção de duas moradas, a maior parte delas são cobertas de telha vã (sem forro), e guarnecem as ruas com muita irregularidade em suas frentes, e alturas: a rua direita está no ponto mais elevado, disposta ao longo do cabeço do monte; depois segue-se a do meio, e são as mais povoadas; à rua do meio segue-se a nova, e a esta a da Boa Vista, que é mais baixa, e a menos povoada; a qual tem grandes espaços tapados com muros de taipa, e outros inteiramente abertos. 



Há nesta Vila três Igrejas; a Matriz, da invocação de Nossa Senhora do Desterro, colocada quase no centro da Vila, com uma pequena praça na frente; a de Nossa Senhora do Rosário, situada na extremidade da parte de S. Paulo (ocupava o espaço entre o prédio do Gabinete de Leitura e o antigo quartel) e a de S. Bento (o atual Mosteiro), no outro extremo, havendo entre esta, e a Vila, um comprido largo coberto de pequenos arbustos. 

Foi Jundiahy no seu princípio uma Freguesia,  erecta há perto de cento e oitenta anos: tira o nome do rio Jundiahy, e estes dos peixes chamados Jundiás, a cuja palavra juntando-se-lhe o y, que tendo na linguagem Indiana a pronúncia de ú francês, quer dizer rio, assim os dois substantivos formam um só nome que exprime rio de Jundiás, ou rio em que há Jundiás. 

É esta Vila pouco povoada, porque grande número de seus moradores, se aplica à cultura das terras; principalmente no tempo dos roçados para as plantações: e outros saem por camaradas, e arrieiros (tropeiros) das diversas tropas; que ali se arranjam do preciso, para seguirem jornada; e em que se empregam, todos os anos, de oitocentas a mil bestas, o que forma um mui útil ramo de negócio destes habitantes

O açúcar, aguardente, e toucinho são os principais gêneros de exportação: colhe-se milho em quantidade, arroz, legumes de várias qualidades, e especialmente feijão: fazem farinha de mandioca; plantam algum trigo, e criam gado vacum, e cavalar (em outro post já falamos da produção agrícola em nossa cidade)

Há no Termo perto de quarenta engenhos, entrando neste número os de aguardente, situados pela maior parte na serra de Japí, cinco léguas distante, que corre do Nordeste, ao Sudoeste, e fica ao Sueste da Vila: é o melhor local de todo o Termo para produzir a cana (em outro post já tratamos do assunto)

Ao rio Jundiahy-Guaçú se vão juntar os ribeiros Quapéba (Guapeva), e Mangabaú (Anhangabau), que atravessam a estrada geral; e passam junto à Vila. Uma grande parte de seus habitantes tem os pescoços defeituosos por causa da moléstia, a que vulgarmente chamam papos (bócio,  aumento do volume da tireoide geralmente causado pela falta de iodo), que ataca as pessoas de ambos os sexos, e até de menos idade; julga-se que esta moléstia provém da qualidade das águas.

Na noite de 6 para 7 de Setembro, estando eu aqui de pouso, às 11 horas pouco mais, ou menos, houve um tempestuoso furacão, que se fez notável pelos seus efeitos: a trovoada foi horrível, e, entre os muitos raios que ofenderam a terra, um caiu sobre a Matriz, o impetuoso vento arrancou telhas, derribou algumas casas, e fez grande estrago nas plantações, e arvoredos: disseram alguns velhos do lugar, que não se lembravam de ter havido um temporal semelhante nos seus dias".

Encerrando a menção à nossa cidade, D'Alincourt descreve a saída em direção a Campinas: "De Jundiahy segue o caminho no prolongamento da rua direita, e toma por detrás de S. Bento em ladeira, pelo declive, que tem o monte, que termina no rio Jundiahy-Guaçú, que se passa por uma ponte estreita, construída de madeira e corre nesta paragem do Nor-noroeste, ao Sul-sudoeste: junto a ele, da parte da Vila, há seis pequenas moradas de casas; e a este sítio dão o nome da ponte (Ponte de Campinas): a estrada vai a Oes-noroeste plana, e coberta de arvoredo". 

Sem dúvida, uma visão interessante da velha Jundiahy.

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